Livro Dendrometria e Inventário Florestal
Carlos Pedro Boechat Soares; Francisco de Paula Neto; Agostinho Lopes de Souza
INVENTÁRIO POR BITTERLICH
1. Preliminares
Os inventários florestais são realizados, em sua maioria, utilizando-se parcelas de área fixa. No entanto, no princípio idealizado pelo engenheiro florestal austríaco Walter Bitterlich, em 1948, as unidades de amostra possuem área variável e a seleção dos indivíduos é efetuada com probabilidade proporcional à área basal ou ao quadrado do diâmetro e à freqüência do número de árvores. A amostragem empregando o princípio de Bitterlich também é conhecida na literatura como método de amostragem proporcional ao tamanho (PPS), bem como a amostragem por ponto horizontal.
Devido à simplicidade do procedimento para obtenção dos dados, a aplicação desse princípio pode ser de extrema utilidade, principalmente nas situações em que se necessita de diagnóstico rápido e preciso do estoque de madeira, entre outras características das florestas, a um menor custo. Porém, deve-se ressaltar que, para fins de planos de manejo, nos quais há a necessidade da caracterização da composição de espécies da floresta, este procedimento deve ser realizado com cautela. Se a floresta possuir diversidade grande de espécies, estas podem não ser caracterizadas, uma vez que um número menor de árvores é amostrado em cada ponto, necessitando-se, portanto, de maior intensidade amostral (FARIAS, 2001).
2. Parcelas de área fixa versus parcelas de áreas variáveis
Kirby (1965), trabalhando em povoamentos de Spruce aspen de várias idades, comparou a amostragem por ponto horizontal com aquela por parcelas de área fixa, em igual número de pontos de amostragem, estabelecidos no centro de cada parcela. Segundo esse autor, os pontos foram estabelecidos em tempo de três a quatro vezes menor que as parcelas. Além disso, os dois tipos de amostragem forneceram estimativas de área basal estatisticamente iguais.
Trabalhando com simulações de formas e tamanhos de unidades de amostra e considerando alguns processos de amostragem para povoamentos de Eucalyptus alba Rewien, Silva (1997) concluiu que unidades de amostras retangulares foram as mais eficientes. Outras formas de parcelas e a amostragem utilizando o princípio de Bitterlich, com os fatores de área basal 1, 2, 3 e 4, não atenderam à precisão requerida definida previamente (10%). Todavia, segundo esse autor, diante do reduzido número de indivíduos observados por ponto, o método torna o trabalho de operações de coleta de dados mais econômico, sendo viável a ampliação da intensidade amostral, diminuindo, assim, o erro de amostragem.
Souza (1981) comparou a amostragem utilizando parcelas de área fixa e variável em povoamento Eucalyptus grandis de origem híbrida, concluindo que a amostragem por ponto horizontal (princípio de Bitterlich) foi mais eficiente que a por parcela de área fixa, considerando-se os tempos totais de medição e de alocação das parcelas, bem como os tempos de qualificação e medição das árvores selecionadas, com o fator de área basal igual a 1.
Couto et al. (1990) compararam a amostragem utilizando o princípio de Bitterlich (fatores iguais a 2, 3 e 4) com o método de parcela de área fixa, na estimação do número de árvores por hectare em uma área plana e em outra acidentada, em plantios de Eucalyptus saligna. Concluíram que o método de Bitterlich estimou com precisão o valor médio do número de árvores por hectare nas diferentes áreas, nos três fatores de área basal estudados. Contudo, verificaram maior variância entre as estimativas obtidas pelos pontos em relação à variância entre parcelas de área fixa, o que indica a necessidade do aumento do número de pontos para se atingir dada precisão requerida.
Moscovich et al. (1999), ao compararem a amostragem utilizando parcelas de área fixa e variável, em floresta de Araucaria angustifólia, verificaram que o método de Bitterlich foi o que mais se aproximou do valor real do volume por hectare. No entanto, ele superestimou o número de árvores por hectare e subestimou a estimativa de área basal também por hectare, em relação à estimativa obtida pelas parcelas de área fixa.
3. O princípio de Bitterlich
O princípio a que Bitterlich denominou prova de numeração angular baseia-se no seguinte postulado: “o número de árvores (n) em um povoamento, cujo DAP em um ponto fixo aparece superior a determinado valor constante (a), é proporcional à sua área basal por hectare (B)”. Assim, a área basal por hectare em um ponto de amostragem pode ser obtida multiplicando o número de árvores com DAP superior ou igual à abertura angular (árvores qualificadas) por um fator de área basal (K).
Além da área basal por hectare, o procedimento de amostragem utilizando o princípio de Bitterlich pode fornecer outras estimativas populacionais em um ponto de amostragem, por exemplo o número de árvores e o volume por hectare e a altura e o diâmetro médios. Os estimadores desses parâmetros são dados por:
Em que: Asi = área seccional da i-ésima árvore qualificada no ponto de amostragem, em m2; n = número de árvores qualificadas no ponto de amostragem; Vi = volume da i-ésima árvore qualificada, em m3; DAP = diâmetro da i-ésima árvore qualificada, em cm; K = fator de área basal, em m2/ha; Ni /ha = número de árvores por hectare que a i-ésima árvore qualificada representa; e Hi = altura da i-ésima árvore qualificada.
A escolha do fator de área basal (K) dependerá de fatores como:
a) Densidade populacional: em florestas com muitos indivíduos por hectare, a utilização de fatores menores acarretará grande número de árvores qualificadas. Além disso, há a possibilidade de haver dificuldade de visualização das árvores mais distantes do observador, devido à sobreposição de árvores na linha de visada. No entanto, se as árvores estiverem muito distantes umas das outras, fatores maiores podem qualificar muito poucas árvores, ou nenhuma, no ponto de amostragem.
b) Declividade do terreno: no local com declividade acentuada, o operador terá dificuldade de se posicionar corretamente para a qualificação das árvores, bem como para realizar as medições das árvores qualificadas. Nesses casos, ele pode optar por um fator que agilize a coleta de dados, porém isso pode implicar a necessidade de lançar um número grande de pontos de amostragem na floresta.
c) Heterogeneidade do povoamento: tanto do ponto de vista dos tamanhos quanto da diversidade de espécies. Florestas com uma única espécie e tamanhos (diâmetros) bem uniformes podem ser amostradas com fatores maiores. Florestas naturais compostas por várias espécies e com uma amplitude grande de tamanhos devem ser amostradas com fatores menores.
Outro aspecto importante da amostragem por pontos é a possibilidade de se qualificar uma árvore mais de uma vez, tendo em vista que não são delimitadas as unidades de amostra no campo. Para que isso não aconteça, os pontos de amostragem devem estar no mínimo a uma distância equivalente a duas vezes a distância crítica (R) da árvore de maior diâmetro possível na floresta mais um Δ (distância) qualquer.
4. Exemplo
Seja uma floresta de 11,0 ha, na qual se realizou um inventário-piloto, através da amostragem por ponto horizontal (Bitterlich), sendo lançados cinco pontos de amostragem e utilizando um fator de área basal (K) igual a 1. Assim, têm-se os seguintes dados brutos e processados por ponto de amostragem:
O volume de cada árvore individual foi obtido pela equação fornecida pelo CETEC (1995):
em que: DAP = diâmetro à altura do peito, em cm; e Ht = altura total, em m.
As estimativas dos parâmetros populacionais, por ponto de amostragem, são mostradas a seguir:
Prosseguindo a análise do inventário-piloto, obtêm-se as seguintes estatísticas do volume por hectare:
a) Média estimada
b) Variância da amostra
c) Desvio-padrão
d) Coeficiente de variação
e) Tamanho da amostra
Para atender a uma precisão requerida (E) de ± 20%, em um nível de probabilidade igual a 95% a amostra deveria ter o seguinte tamanho:
·t(5%; 4 gl) = 2,776
Recalculando o tamanho da amostra para t(5%; 4 gl) novamente, tem-se que os cinco pontos de amostragem foram suficientes para garantir uma precisão requerida de ± 20%, a 95% de probabilidade. Cabe ressaltar que, se fossem necessários mais pontos de amostragem para garantir a precisão requerida, dever-se-ia completar a amostra para depois efetuar os cálculos das estatísticas do inventário definitivo.
* Inventário definitivo
a) Média estimada
b) Variância da amostra
c) Erro-padrão da média
d) Erro de amostragem em porcentagem
· t(5%; 4 gl) = 2,776
e) Estimativa do volume total da população
f) Intervalo de confiança
5. Referências Bibliográficas
COUTO, H.T.Z.; BASTOS, N.L.M.; LACERDA, J.S. A amostragem por pontos na estimativa da altura de árvores dominantes e número de árvores por hectare em povoamentos de Eucalyptus saligna. IPEF, n. 43/44, p. 50-53, 1990.
FARIAS, C.A. Comparação de métodos de amostragem para análise florística e estrutural de florestas inequiâneas. Viçosa, MG: UFV, 2001. 49 f. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) – Universidade Federal de Viçosa, Viçosa.
KIRBY, C.L. Accuracy of point sampling in white spruce – aspen stands of Saskatchewan. Journal of Forestry, p. 294-296, 1965.
MOSCOVICH, F.A.; BRENA, D.A.; LONGHI, S.J. Comparação de diferentes métodos de amostragem, de área fixa e variável, em uma floresta de Araucaria angustifolia. Ciência Florestal, v. 9, n. 1, p. 173-191, 1999.
SILVA, L.B.X. Tamanhos e formas de unidades de amostra aleatória e sistemática para florestas plantadas de Eucalyptus alba Rewien. Floresta, v. 8, n. 1, p. 13-18, 1997.
SOUZA, A.L. Comparação de tipos de amostragem, com parcelas da área fixa e variável, em povoamentos de Eucalyptus grandis de origem híbrida, cultivados na região de Bom Despacho, Minas Gerais. Viçosa, MG: UFV, 1981. 79 f. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) – Universidade Federal de Viçosa, Viçosa.